quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Hás-de sempre estar


Querido Padrinho,


Hoje faz precisamente oito anos que te perdi. Foi e sempre será sempre a perda mais crucial da minha vida. O ser humano pode ser adaptável a tudo, excepto às despedidas. Somos dotados de uma capacidade imensurável de julgarmos adquiridos sempre os nossos ente-queridos. O teu sangue não corre nas minhas veias, contudo, o teu amor-de-pai é a força mais subtil do mundo que conheci. Não vou desnudar por escrito tudo aquilo que penso e sinto, tu sabes e, também não existiria palavras que espelhassem genuinamente tudo aquilo que vai aqui dentro.
Quero apenas relembrar-te que foste embora deste mundo mas que continuas vivo em mim. Como tu bem sabes, daquelas conversas longas, silenciosas e por vezes chorosas que temos, há pessoas que se morressem no minuto-agora, não me comovia. Não vou descrever pormenorizadamente o momento do adeus, ou melhor do nosso até já, estamos eternamente ligados. A presença física desvanece, mas o amor permanece. As almas continuam a dialogar e sabes porquê? Porque a pior morte é aquela que sucede em vida, é quando a pessoa perde o seu valor para nós.Essa morte, mata-nos. Levo-te sempre comigo para onde quer que vá. A terra tapou o teu corpo, o céu permite-me observar o teu sorriso encorajador para apaziguar sempre a minha dor. A tua memória é o comando principal da minha vida. 
Hoje, recordo de forma nostálgica os últimos flashs do teu rosto, é como que a vida pudesse por instantes transformar-se numa câmara e te trouxe-se novamente para junto de mim. A morte é a única certeza que podemos ter, contudo, a melhor maneira de encará-la é sentir que fizemos tudo ou praticamente tudo que estaria ao nosso alcance uma vez que a homenagem mais verdadeira se faz em vida. Se me perguntarem ainda te dói a tua perda? Não vou mentir, não machuca tanto, não me faz perder o sono como no primeiro dia e naquele que foi o impacto com a dura realidade, mas, continua a doer, uns dias mais, uns dias menos, como tudo na vida. Há duas opções: ou aceitas ou te revoltas. Posso dizer que já vivi cada uma individualmente e as duas em simultâneo e que hoje apenas posso afirmar que nunca me esqueço de ti apesar de nem todos os dias pensar em ti. Revolta-me a tua perda porque ainda tínhamos tantas histórias para viver juntos, porém, aceito-a, sei que é a melhor forma ou a menos dolorosa de lidar com a tua ausência física. Há acontecimentos no nosso percurso que contribuem significativamente para o ser humano que te tornaste. Quando partiste eu era uma menina. Hoje sou uma menina-mulher. A tua pensão de invalidez embora apresente uma quantia pequena contribuiu significativamente para pagar os meus estudos tal como pediste à madrinha para que nunca desistisse de mim, utilizando as tuas palavras: "Faz pela Laura! Ela merece, ajuda-a chegar longe"! A Licenciatura já cá mora à dois aninhos e estou no 2º ano de mestrado e estagiar na minha área e na minha cidade, que mais poderia fazer para te orgulhar? O maior prazer da vida reside em concretizarmos o que julgam não sermos capazes de alcançar e com mérito. Continuo a mesma menina sonhadora mas tornei-me uma guerreira. A tua missão foi cumprida. Sorri. Tu partiste como um herói e é assim sempre que te recordei.. Quando se apreende a viver num mundo de alguém, é crucial aceitar a sua perda. Desesperamos quando relembramos a sua falta. Apenas é física a saudade que se nutre, porque o amor incondicional mora sempre no coração onde penetrou e permaneceu...
Há uns dias atrás, na minha folga, fui congratular-te com flores e iluminar a tua sepultura. Sabes que não preciso do dia que todos vão ao cemitério, o bem-dito dia 1 de Novembro, todos os dias são especiais para te recordar e te mimar tal como não preciso que chegue este dia para te escrever mas tu sabes o quanto me custa escrever-te, os textos parecem-me sempre imperfeitos e vazios.... por algum motivo os verdadeiros poetas tem dificuldade de escrever aquilo que realmente sentem...
A fotografia que aqui posto é a única que temos juntos, acreditas? Como é possível não é? Hoje tira-se a fotos a tudo e por nada. Tempo volta atrás. Transforma as minhas memórias num álbum de fotografias para que quando a saudade me sufoque, o consulte. Se um dia subir ao altar, não terei a tua mão para me acompanhar... 

Hás-de sempre estar (...)